sexta-feira, 1 de junho de 2007

A gordinha Carente - por Mário Prata


ROSA GAÚCHA, cronista social (Sorocaba, 1998)
Gordinhos, gordinhas, estressados e estressadas, quando se dirigem ao spa São Pedro em Sorocaba sempre dão uma paradinha no Tigrão. Tigrão é um posto, do lado direito de quem vai. Restaurante farto, bebidas visíveis, colesterol à vista e a prazo. É ali que eles e elas entram e se enchem, prevendo as futuras 300 calorias, as cetoses e as boboses que se avizinham. É ali que elas e eles se reabastecem, enchem o tanque e pedem perdão a São Pedro.
Foi ali que o fato se deu. E eu, como sempre, estava lá.
Ela, além de viciada em comida, era viciada em spa. Lá ia ela, dia desses. Tigrão. Ela estava de licença no spa. Depois de um mês, tivera dois dias em São Paulo. Estava voltando. Já havia emagrecido dez quilos. Já era bastante, pra quem precisava ainda perder uns 30.
Ela encheu a cara e a barriga e ainda pegou uns bis para matar nos quilômetros finais. Foi quando se dirigia para o caixa que ela ouviu. Ouviu nitidamente. O assovio. Aquele que os homens fazem quando passa uma mulher gostosa. Fiu-fiiiiu. Estática, seu olho girou 180 graus. Não havia dúvida. A coisa era com ela.
Aquilo foi uma injeção de cinco mil calorias no ego dela, no superego e até no alter ego. Há quanto tempo ela não sentia aquela sensação de tesão subindo pelo seu corpo num frenesi? Vinte e cinco anos? Mais? Ficou ali, estática, parada no contrapé da felicidade. Tentou dar um passo e, de novo, o assovio. Ela precisava ver quem era, senão não tinha graça. Virou-se graciosamente, com o maior charme possível que a sua cinturinha permitia. Olhou em volta. Nada. Onde estava o galanteador?
Deu mais um passo. Fiu-fiiiiiu, de novo. Foi andando na direção de um macaco-boneco de uns 30 centímetros. Quanto mais ela se aproximava, mais o macaco assoviava. Era o macaco seu amante já imaginário e com milhares de planos e sacanagens na cabeça.
Era isso. Um boneco. A primeira idéia foi pegar o macaco, arrancar a pilha dele, jogar no chão, pisar seus gordinhos pés em cima dele. Mas resolveu esquecer. Afinal, ninguém havia notado seus 15 segundos de fama. Cabeça e estima baixas, já estava no carro quando resolveu voltar. Comprou o macaco.
Na estrada, depois de dar o nome de Castanho ao macaco e ficar passando a mão na frente da boca dele para ouvir, ia feliz. A pilha era duracel, ia durar muito.
No spa, instalou o Castanho em cima da televisão, numa posição estrategicamente estimulante. Ia ao banheiro, o macaco Castanho assoviava. Voltava, fiu-fiiiiiu. Levantava, tava lá. Seu cooper dentro do quarto passou a ser todo dedicado ao Castanho. Já sabia a que distância tinha que sé aproximar para provocar a libido do macaquinho.
De noite, quebrou a solidão com um maravilhoso strip-tease para ele. Só para ele. O Castanho não dizia nada, nem mexia os olhinhos, ouvindo "Summertime". Só assoviava. Cada peça de roupa tirada era jogada na direção do bichinho. O bichinho não falhava. Ela foi se entusiasmando e, nua, fez coisas que não fazia há muito, mas muito tempo mesmo.
A notícia do macaco Castanho logo tomou conta do spa. Gordinhas (e até uma bicha gordinha) queriam comprar o levantador de baixa estima. Pensou-se em aluguel, em rodízio, em consignação. Mas ela não abria mão. Chegaram a oferecer dois bagos de uva e dois palitinhos de cenoura pelo uso e abuso do animal. Mas ela queria o danado só para ela.
Foi quando a doutora Aída, psicóloga do local, conseguiu convencer nossa heroína — sabe-se lá como — de que o Castanho era fundamental para o spa. Que ela deveria dividir seu prazer com as colegas de polegadas a mais. Ela concordou, mas com uma condição. Tudo bem, mas só uma vez por semana e tinha que ser coletivo.
O dia escolhido foi domingo à noite. Ela colocou seu amado amante em cima do balcão do bar do restaurante e foi então que começou a orgia. Todas as gordinhas entravam — muito bem vestidas, algumas decotadíssimas — e iam pra frente do balcão.
Fellini morreu sem imaginar a cena. Calígula morreria de inveja. Uma a uma e depois duas a duas, três a três, desfilavam seu corpo diante do Castanho, que parecia entender o coração de cada uma delas. E não negava fogo.
Depois de umas duas horas daquela desenfreada sacanagem, o assovio foi ficando fraco, fraco. A pilha está acabando! Minha ceia por uma pilha! Meu almoço por uma pilha!, gritou uma. Dou cinco sobremesas por uma pilha! Mas era domingo de noite, não tinha pilha. Trinta gordinhas (e a bichinha), amontoadas e ajoelhadas pediam para Castanho não parar, pelo amor de Deus.
Mas o macaco Castanho estava cansado. Não estava programado para tantas e boas meninas.
Mesmo assim o spa dormiu feliz sabendo que, no dia seguinte, ia ter mais pilha.

Nenhum comentário: