terça-feira, 26 de junho de 2007

Cadeira de chefe


Retirado de http://www.abobra.blogger.com.br/2004_02_01_archive.html



A Cadeira de Couro

baseado em fatos reais


- Eles vão lhe dar um presente, quando anunciar sua promoção. Não aceite. Eu só posso dizer isso. Não aceite, em hipótese nenhuma !


As últimas palavras de seu pai Constantino, ficaram marcadas em seu pensamento, foi o último conselho dado segundos antes de falecer sobre o seu leito no hospital. Constantino era um dos sócios da Aveltron Telecomunicações, seu filho herdara a mesma garra nos negócios utilizada por seu pai durante os 50 anos que trabalhou na empresa. Seu pai tinha uma faro para oportunidades, uma alma empreendedora, um guru na gestão de novos produtos, graças a Constantino, a Aveltron era uma das maiores empresas na área de soluções em Telecomunicações na década de 80 e seu filho carregava agora sozinho, essa carga de responsabilidades. A missão de tirar a Aveltron na eminente falência.


Chegou o dia da tal promoção exatamente 10 anos depois do falecimento de seu pai, durante todo esse tempo Frederico trabalhando em cargos de pouca importância , viu a empresa que seu pai construíra se fragmentar aos poucos, todos os dias nesses anos, sem poder fazer nada para reverter o quadro decadente. Estavam todos na suntuosa sala de reuniões, todos os executivos da empresa a espera de Frederico. As palavras de seu pai gritavam em sua mente enquanto ele entrava no recinto: "Não aceite o presente. Não aceite o presente". A sala era ampla e suas janelas davam de frente para o oceano Pacífico , nada comparado as outras pequenas janelas distribuídas em outras repartições da empresa, onde os funcionários menos remunerados tinham que se contentar com a vista poluída de prédios onde os raios solares raramente davam a graça. Mas na ala sul do edifício onde ficavam as salas dos executivos e da presidência, foram projetadas com grandes janelas panorâmicas bem iluminadas pelo sol e uma da melhores vistas da cidade. Podia se ver toda praia de Balinu com o sol refletido sobre o mar, as garotas com seus trajes de banhos e surfistas brincando em suas ondas colossais. Podia ficar horas e mais horas contemplando sua paisagem, mas tal benefício eram guardados apenas pelos endiheirados da Aveltron.


Dentro da sala, havia uma grande mesa de reunião de madeira nobre e as paredes eram forradas com quadros de seus antigos presidentes. Eram 15 sócios presentes na reunião , contando o presidente e seu vice-presidente. Em outra cadeira distante, uma secratária executiva e dois copeiros de uniforme que traziam de café até as mais caras bebidas. Todos os sócios com seus ternos caríssimos de grifes francesas e italianas, mantinham uma pose fria, todos tinham carros importados e vagas reservadas no estacionamento para seus carros de luxo. Mas nas suas caras, se via olhares de desespero, porque a Aveltron estava mal das pernas e acreditavam que Frederico carregava consigo uma solução para reverter o delicado processo. O Presidente acreditava que o espírito de Constantino estava agora com seu filho. E estava mesmo.


- Frederico, como foi desejo de seu pai, até que você adquirisse maturidade e pelo destaque que vem tendo entre os funcionários da Aveltron, decidimos lhe entregar o cargo de Diretor Executivo da empresa. Como é conhecimento de todos, a empresa está perdendo mercado para os concorrentes. Infelizmente não estamos conseguindo desenvolver um produto de qualidade, estamos lhe entregando todos os poderes para nos ajudar reverter esse processo de decadência em nossa empresa. Faça o que for preciso. - disse o presidente


Frederico fez um discurso breve de agradecimentos, tentando levantar a moral dos executivos. Foi aplaudido de pé com suas palavras, alguns até soltaram lágrimas quando o filho usou as palavras do pai


- Meu pai dizia, "Use a sua percepção. Olhe e análise tudo ao seu redor. Utilize da criatividade e as coisas acontecerão"


Foi aplaudido novamente. Parecia que ali na frente deles estava o velho Constantino. Então o presidente disse:


- Como é uma tradição na Aveltron, sempre que promovemos um novo executivo, lhe damos de presente uma cadeira de couro, para usar em sua nova sala. - a secretária veio então arrastando pelas rodinhas cromadas a formidável e suntuosa cadeira de couro. Tinha um encosto para a cabeça e apoio acolchoado para os braços, toda preta do mais caro revestimento. - Essa cadeira representa agora o poder que você tem na Aveltron.


Frederico olhou para a cadeira, e seu coração batia forte. Era o trono da soberba, da desgraça corporativa, aquela cadeira de couro era o símbolo da destruição da Aveltron.


- Não posso aceitar essa cadeira. Essa é a minha primeira atitude como Diretor Executivo da Aveltron.

- Deixa de ser bobo Frederico. É só uma tradição. - disse um outro executivo

- Existe algumas coisas que tem que ser mudadas na Aveltron. Prefiro minha cadeira de digitador.


As palavras de Frederico, fizeram os executivos suarem frio. Pensavam: "Seria ele um anarquista ? Como ousa quebrar uma das mais antigas tradições da empresa ? O presidente sem palavras, mandou a secretária recolher a cadeira, ele mesmo fora amigo e confidente de Constantino, parecia que o próprio estava ali a sua frente, incorporado no próprio filho, criando polêmicas e levantando discussões.


- E mais uma coisa. Não quero que minha sala tenha paredes e portas maciças de madeira, quero que as pessoas me vejam lá dentro. - falou olhando nos olhos de todos que ali estavam


Todos riram de Frederico, não acreditando em suas palavras. Mas ele continuo sério e inquieto. E foi isso que aconteceu, as paredes de sua sala foram trocadas por paredes de vidro, onde todos no andar podiam ver a claridade do sol que vinha por trás de Frederico, e o mar que repousava no horizonte. A popularidade dele entre os funcionários ficou calorosa. Um dia ele fretou vários ônibus num horário de trabalho e levou todos para uma seção fechada de uma sala de cinema no meio da tarde de serviço. Os executivos ficaram furiosos, e suas reclamações foram levadas ao presidente, que não deu importância. Todas as semanas seguintes algo de novo na empresa, um almoço improvisado num parque, pizzas no fim de tarde, café de manhã dentro da empresa. Então um grupo de executivos veio a sala do presidente vociferando acusações:


- Presidente, o Frederico está utilizando nossas reservas monetárias para alimentar a algazarra entre os funcionários. As sextas-feiras ele tem vindo de bermuda e chinelo para a empresa. E alguns funcionários antes que usavam trajes sociais, agora andam pelos corredores com as mesmas roupas que se usa quando vão aos supermercados ou parques. ¿ gritou um


- E esses gastos extras com atividades fora do escritório que agora são semanais ? Nossos contratados perdem horas em atividades recreativas, onde poderiam estar na empresa produzindo. E o pior, fui informado de funcionários que estão trabalhando em casa, para ficarem perto dos filhos. - gritou outro


- Se o senhor não tomar uma providência , não conseguiremos sair desse buraco que nos cerca. - concluiu outro


O presidente paciente ouviu todas as reclamações e depois calmamente falou:


- Entendam ! Ele consegui enxergar a raiz de nossos problemas. Durante todos esses anos tratamos o funcionário como uma ferramenta mecânica. Ele está provando que nosso maior bem é nosso funcionário, se não o tratamos bem, então nossos produtos não são tratados com o devido carinho. - então levantou de sua cadeira e disse com determinação - Senhores, a empresa está mudando, e o reflexo disso está nas vendas que aumentaram 20 % nos últimos meses.


Todos os executivos colocaram paredes de vidros em suas salas, todos os funcionários tinham acesso a informações apenas reservados as gerências. Foi dado cotas de ações da empresa para todos os funcionários, independente da hierarquia. Quando a empresa tinham ganhos acima das metas, então era repartido entre todos. Os executivos, diretores e gerentes perderam as vagas reservadas no estacionamento, agora eles eram tratados com o mesmo nível que era dispensado ao colega de menor hierarquia. Aquela enorme e suntuosa sala de reunião, apenas utilizada pelos figurões da empresa, foi transformado em uma sala de jogos e bate-papo. Os copeiros agora ofereciam café, chás e pães aos funcionários que no intervalo de suas atividades relaxavam sobre as cadeiras de couro distribuídas perto das enormes janelas que traziam toda a claridade e formosura do Pacífico banhando as praias de Balinu.


Frederico então conseguiu o cargo de seu pai. Foi convidado a ser presidente da Aveltron, que voltará a ser uma das gigantes no seu setor de atuação, graças a funcionários estimulados e valorizados.

Nenhum comentário: